A Floresta Erech não era um lugar para se andar desprotegido. Diziam os habitantes de Rashmen, pois homens em forma de árvore viviam na floresta, e enormes rochas ganhavam vida e agrediam os transgressores além de inúmeros outros horrores.
A Floresta Erech definitivamente não era um lugar para se andar, ainda mais a noite, ainda mais por um mago vermelho.
Ikal Tekish, um homem de meia altura, vestindo um roupão escuro que cobria as tradicionais robes vermelhas dos arcanos de Thay, possuía sua cabeça calva coberta com tatuagens e um filete de cabelo único e comprido entrançado que nascia do único ponto não raspado de sua careca. Com passos sorrateiros e rápidos, ele atravessava a floresta, a respiração ofegante denunciava o medo que o homem sentia por estar naquele local. Infelizmente ele era um mago de baixo escalão, um relez aprendiz, com algumas míseras habilidades. Ikal compreendia que na sociedade dos arcanos vermelhos não havia muito local para ele a não ser que ganhasse poder e prestígio.
Era um descarte em seus primeiros anos de arcano e ele sabia disso, por isso tinha conhecimento também que se ele fosse morto em sua missão ninguém daria por sua falta.
Mas apesar de tudo Ikal estava obstinado a não falhar em sua missão. Ele ansiava retornar e galgar os degraus promissores de Thay e se tornar um zulkir da magia. O posto máximo de um mago especialista dentro do reino de Thay. O sonho de Ikal era compartilhado por praticamente todo conjurador de magias de Thay. Somente os mais fracos e tolos não ousavam sonhar com isso e se conformavam com suas pocisões inferiores.
Ikal no entanto tinha sonhos, ambições e isso é a mola propulsora de uma arcano vermelho. Meneando a cabeça ele se concentrou em seu objetivo e adentrou mais profundamente na floresta.
Com o adentrar da noite mais sombria e sinistra a floresta de Erech se transformava, mais sons de criaturas da noite eram somados a sinfonia noturna, mais assustadora a mata se tornava.
A vegetação verdejante e reluzente comumente vista durante o dia, com suas copas de árvores seculares mudava ao cair da noite. Sedutora a luz do dia era soturna a noite.
Cada minuto a mais na floresta fazia com que Ikal se enervasse mais. O pensamento de encontrar qualquer criatura que tivesse de enfrentar só não era mais assustador do que a sombra que lhe corroia quando imaginava um arbusto como sendo um bárbaro ou uma feiticeira de Rashmen. Esses inimigos cruéis e de longa data dos arcanos, não iriam oferecer ajuda ou apoio. Iriam sim levantar suas armas e feitiços no primeiro trocar de olhos, pois o arcano estava em seus domínios. A floresta pertencia a nação de Rashmen com seus guerreiros furiosos e suas magas intrépidas que se entitulavam bruxas e desafiavam o poder dos thayanos.
Por eras as duas nações guerrearam, mas Rashmen sempre conseguir resistir ao poder de Thay. Agora após um período de dois longos anos de tréguas tudo estava para mudar.
O plano de Ilmok Opala da Noite, um mago de Thay com poder considerável era muito bom. Não fosse um problema, o que ele precisava se encontrava em Rashmen. Ele já havia perdido três aprendizes no curso dos últimos quatro meses, e quando chegou a vez de Ikal provar seu valor ele decidiu que não seria o quarto a não voltar a Thay. Subitamente os pensamentos do mago sumiram, um ruído próximo lhe cativou a atenção. Todos os seus músculos ficaram tensos. Sua boca ansiava por gritar de pavor e medo, pois Ikal sabia que não era páreo para a menor e mais fraca das criaturas. Ele levou a mão em direção ao pergaminho de teleporte que o levaria diretamente aos aposentos de seu mestre, mas recuou vagarosamente lembrando-se de que desertar sua missão iria lhe impor terrores maiores do que a morte.
O jovem mago ficou parado, quieto, petrificado, controlando todos os músculos de seu corpo para que não fizesse o menor ruído.
Ele quase perdeu os sentidos quando de dentro da floresta um enorme vulto peludo de quase dois metros saiu e prosseguiu por seu caminho em direção oposta a sua.
Ikal ficou aliviado pelo animal não ter notado sua presença, nem ter sentido seu cheiro, pois seu corpo se encontrava encharcado de suor, liberado por seu pânico iminente. Porém, algo ficou intrigando o mago, pois o animal não o atacou porque não sentiu seus odores, e ele conhecia o alto grau de faro dos mamíferos, pois um mago também era um estudioso, um conhecedor do mundo. Estaria a floresta lhe poupando?
Foi no instante seguinte que Ikal descobriu o porque de suas perguntas e lamentou-se de não ter aproveitado do elemento surpresa para ter feito qualquer ação por menor que fosse para lhe dar alguma vantagem.
O enorme animal virou sua cabeça e com os enormes olhos de uma coruja localizou perfeitamente a posição do mago. Com um pio alto a enorme besta anunciava o ataque. Pois o urso-coruja havia encontrado sua caça da noite.
O arcano viu a besta erguer-se sob suas patas e avançar com agilidade descomunal sobre ele. Em segundos seria feito o quarto aprendiz a não retornar para seu mestre a não ser que ele conseguisse fazer algo rápido. Mas um arcano de Thay mesmo um mago assustado e encurralado como Ikal não era um oponente fácil.
Criados na terrível terra de Thay onde até respirar era um fardo, o povo deste país aprendeu desde cedo a se comportar em combate, pois cada ano da própria vida de cada pessoa é uma provação nessa terra e Ikal havia nascido e crescido thayano. No instante em que a luta pela sobrevivência teve local, o jovem mago covarde deu lugar a uma pessoa calculista. Em instantes o arcano entendeu o urso-coruja, uma enorme besta com todo o corpo em forma ursídea, mas tendo nas patas dianteiras penas disputando local com pelos e no local da cabeça de urso a cabeça de uma coruja gigante, e percebeu que o fato de o animal não telo percebido em um primeiro momento era pela falta de faro comum aos mamíferos. Era óbvio que a parte de ave comandava a percepção do animal e quando entendeu isso Ikal percebeu que o ponto fraco do enorme animal deveria ser seus olhos.
Dispondo de apenas algumas fracas magias memorizadas o arcano empenhou-se em realizar um truque simples para tentar se salvar. Rapidamente apontando a mão esquerda em direção ao rosto do animal e pronunciando uma palavra mágica muito rápida o mago conjurou uma magia de luz.
O truque um dos mais banais para um mago pegou a enorme criatura desprevenida. Acostumada a enxergar perfeitamente bem a noite e em completa escuridão a besta é completamente derrotada no instante em que a luz conjurada pelo mago se instala em seus enormes olhos de rapina.
O monstro cego pela luz, e afetado ainda mais pelo choque de visão, assusta-se e joga-se para traz. Para sorte total do mago um pequeno barrancão de não mais do que alguns metros de altura se encontra no local e o urso-coruja desajeitado rola por ele.
A besta ao rolar o local fica um pouco tonta mas totalmente recuperada, visto que o pequeno feitiço tem uma duração rápida. Ainda assim o animal afasta-se calmamente silvando, considerando talvez que o mago fosse muito mais poderoso do que na realidade ele era.
Com suas mãos e sua concentração prontas para realizar a continuação do ataque o frio e calculista mago de Thay deu lugar mais uma vez a sua personalidade amedrontada e o arcano suspirou aliviado por sua vitória quanto ao embate realizado. Essa vitória embora simplória garantiu ao arcano convicção o suficiente de que ele realizaria a tarefa que lhe fora designada. Um pouco mais confiante agora o mago reiniciou sua caminha em direção ao interior da floresta. Encolhendo-se um pouco pois o tardio da hora fez o vento gélido do inverno que se aproximava pesar de uma tal maneira que o mago quase desejou por outro encontro com alguma criatura apenas para poder se aquecer.
Quase.
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