O suor escorria pelo corpo do homenzarrão, seus olhos doíam a medida que eram forçados sob a luz da lanterna, a procurar o caminho para a linha na agulha. Mas com a perícia de alguém que poderia costurar de olhos fechados, Jurimik, rapidamente conseguiu seu feito e continuou seu trabalho. Seus lábios não cansavam de se mexer em uma oração surda, elevada a deusa Mielikki. As mãos do taverneiro embora estivessem suadas e parecessem desproporcionais para o oficio, desenhavam seus padrões com tamanha graça que mesmo as bordadeiras de Sembia, as mais refinadas costureiras de Faerun, sentiriam inveja, tamanha a habilidade do guerreiro.
Por horas e horas ele repassava todo o caminho percorrido pelas costuras das peças extraordinárias, sempre tendo a linha sendo puxada e esfregada por entre as runas que se encontravam face a face prensando a mesma que forçava seu caminho com sofreguidão.
As runas foram arduamente usadas e duas delas já haviam virado o pó tamanho era o fervor da oração do bárbaro. E embora o trabalho estivesse levando muito mais tempo do que o homem jamais sonhou, ele não dava o menor sinal de desistência. Jurimik sabia o processo de encantamento, sabia que era árduo e tinha certeza de que era necessário que uma grande parcela de sacrifício pessoal fosse usada para que se concretizasse seus anseios.
Longas e torturantes horas de devoção haviam se passado, sem que o homem desse o menor sinal de desistência. Seus dedos encontravam-se inchados e começavam a sangrar devido a fricção causada pela linha polida pelas runas entre seus dedos.
O suor escoria livremente pelo corpo e causava uma sensação de ardência nas mãos que começaram a deixar o bárbaro zonzo. O passar das horas, o jejum e o esforço continuo começaram a cobrar seu preço, mas o taverneiro estava determinado e nada faria com que ele desistisse.
Por final do segundo dia as últimas duas runas haviam sumido. Haviam virado pó, que misturado aos fiapos de linha de costura se encontravam em desenhos dourados nas duas peças confeccionadas pelo ex-combatente.
Cansado, com os braços doloridos e com a mente pesada, o taverneiro tomou o pergaminho em suas mãos e com um pequeno faiscador atiçou fogo a ele, enquanto orava profundamente. Ele desejava que Mielikki ouvisse suas preces e abençoasse o gibão e o cinturão.
A fuligem começou a dançar no ar, a medida em que o papel queimava. Jurimk o segurava firme e sentiu o calor que se alastrava pelo pergaminho se aproximar de suas mãos, querendo forçar com uma dor lacinante de queimadura ao guerreiro que ele largasse o pergaminho. Mas o pai de Toul sabia que não podia larga-lo, sabia que tinha que agüentar e quando ele sentiu sua mão em chamas ele semiserrou os olhos e suas preces se eleveram quase como gritos enquanto o fiel religioso implorava para que seus itens fossem abençoados.
Os pedaços de pergaminhos carbonizados dançavam no ar, enegrecidos e brasentos a medida em que se desprendiam da mão do guerreiro, e se afastavam com a força do vento.
De repente quando o último traço do papel mágico se consumiu nas mãos em carne viva e sangrentas do guerreiro, algo aconteceu. A fuligem negra parou no ar. E com rodopios rápidos girou em uma velocidade assustadora e se juntou aos pós de runa e linha impregnados nas peças. Nem uma única partícula da fuligem se perdeu. Todas foram absorvidas. A dor nas mãos de Jurimik cessou. Suas preces também. Ele abriu os olhos e olhou para sua obra, e se surpreendeu com as novas tonalidades das peças.
O pelo do enorme urso pardo havia se transformado, agora era de prata esverdeada, dando uma coloração reluzente quase que como as gemas preciosas, as safiras das quais os ourives Chessenta tanto se orgulhavam. Foi então que Jurimik olhou suas mãos. Elas não tinham nenhum arranhão, na verdade pareciam até mais belas mais jovens. Ele voltou seus olhos para o cinturão e observou satisfeito vendo que o mesmo tom se encontrava nele. Mielikki havia abençoado seu esforço. Fixando seu olhar mais uma vez no enorme gibão de urso ele deixou escapar satisfeito, por entre seus lábios:
- Espírito de Urso.
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