Ontem foi um daqueles dias em que você diz: a primeira vez a gente nunca esquece.
Acontece que vem fazendo um mês que eu aos 38 anos venho sofrendo de pressão alta. Nada terrivel, 14/10, mas acima do normal que fica em 12/08.
Após uma consulta inicial com meu médico, ele me passou uma bateria de exames, e o principal deles: coração.
"Coração" eu perguntei.
"Sim. temos que ver como ele está." ele me disse.
"Acha que esse aumento de pressão pode ter haver com o coração?" perguntei.
"Este aumento na pressão, pode influenciar seu coração, não podemos correr risco correto?" ele me disse.
Não.
Não podemos.
Assim, aos 38 anos, eu me desloquei a Caxias do Sul para fazer exames. Sai as 9 da manhã, pois precisava autorizar com minha empresa de plano de saúde o exame. O hospital fica a 35 km de minha casa, teoricamente uma viagem fácil, não fosse que a tortuosa estrada é via principal para os caminhões que constituem o principal meio de transporte das empresas do polo industrial daquela cidade. Até não teria tanto problemas andar em meio a caminhões, não fosse o fato de que assim como a minha cidade, Caxias do Sul se localize na Serra Gaúcha.
Logo uma viagem de 30 minutos pode por vezes se extender por mais de 1 hora. Não foi o caso, consegui chegar em 45 minutos, peguei a autorização e me dirigi ao Instituto do Coração.
No caminho eu só pensava; "Vê se funciona direito, nada de me deixar na mão."
Eu já tinha ouvido histórias de como o teste era penoso, não que eu estivesse preocupado com o coração, mas desde que meu maior exercicio fisico semanal, se transformou em levar minha cadela para fazer as necessidades na rua, eu não queria que isto influenciasse no teste. Passei então a uma rotina de caminhar 30 minutos todo dia antes do dito teste. Enquanto caminhava eu pensava; "Tomara que isso ajude, as pernas a suportar...hmmm...melhor, acho melhor ajudar o coração mesmo."
O Instituto do Coração é um prédio bonito, bem amplo e espaçoso, com profissionais atenciosos. Assim que me dirigi a recepcionista ela examinou minha receita e disse. "Andar P2, sala da direita."
Dividi o elevador com outros dois sujeitos que seguiram andares acima, enquanto que eu me dirigi a sala da direita na área P2. Como se tivesse algo no lado esquerdo...
Três moças atenciosas me atenderam tomaram minha ficha e me disseram: "Chegastes 1 hora adiantado, seu horário é 11:45 da manhã."
"11:45?" eu tinha certeza que era 10:45.
"O senhor terá que aguardar" A recepcionista me comunicou com toda educação.
Dando alguns passos disfarçadamente me sentei em meio a uma sala ampla com várias cadeiras vazias, apenas comigo por perto para usufruir delas. Em frente, uma pequena televisão transmitia Jonas Brothers. "Graaande". Pensei.
"Aguardar?" continuei pensando..."Eu estou infartando, eu sinto isso, esperar uma hora, com certeza vai me matar". "Será que ela não percebe que eu vim ver meu coração? Eu quero ver como ele está porra! Não tem mais ninguém na sala, será que eu não posso entrar e acabar com isso de uma vez?"
...Aguardando...
Enquanto isso, fui me distraindo assistindo a sensação da juventude no momento, e pensando, como é que conseguem? Não era tão ruim, mas também não era pra toda esta histeria que o cara vê na televisão a toda hora. E assistindo aos Jonas Brothers e na sequência a... Power Rangers eu tinha certeza. "Meu deus, este lugar é feito pro cara infartar!".
Graças a algum deus esquecido que faz as horas passarem depressa ao qual eu agradeci imensamente, minha hora finalmente chegou.
Uma enfermeira atenciosa e bem simpatica me conduziu até a sala onde eu faria os testes. Lá me aguardava uma esteira de corrida, um medidor de pressão acoplado em algum tipo de móvel feito especialmente para ficar ao lado da esteira, uma série de eletrodos, ligados a esteira que por sua vez estava ligada a um computador adjacente. Na tela eu podia ver meu nome previamente inscrito e alguns dados pessoas.
Em algum lugar eu li: sedentário, em outro: obeso.
É, 92 quilos, para 1,68 não é tão ruim, mas quando se trabalha o dia todo na frente de um micro, a gente não fica com a forma exata de um atleta ou de um peão de construção.
Tive que tirar a camisa e então subir na esteira.
Bom, foi ai que aconteceu; a enfermeira se aproximou e com uma gilete foi raspando meus pelos do peito. Eu não lembro de nunca na vida eles terem sido raspados, que experiência traumatica. Eu realmente comecei a ficar irritado, era bom meu coração não ter nada. Se bem que dai eu teria feito tudo isto pra nada. Talvez se tivesse alguma coisa de leve, hmmmm. Péssima linha de raciocinio. Melhor ficar sem os pelinhos do peito. Meu deus que coisa mais deprimente. E pensar que um monte de homens hoje em dia se orgulha de ter peito liso, feito bundinha de nenê.
Eca que nojeira. Dá nojo, revolta o estomago só de pensar. E pensar que eu praticamente estou entrando nesse time. Mas graças a deus eu sou bem definido sexualmente. Tenho mulher, filhas, nada com que me preocupar. Vai crescer logo eu pensei. Mas merda, agora é verão!
É VERÃO!
E eu não vou ter pelo no peito. Meu deus, preciso usar camiseta o verão inteiro. Quanta humilhação.
Após aquela tortura, meu coração tinha disparado. Era como se tivessem arrancado minha virilidade. Terrivel.
Na sequência, ela instalou os eletrodos, uns vários ao redor do peito. Colocou no meu braço direito aquele troço apertado para medir a pressão e me disse:
"Vamos iniciar a caminhada na esteira, ela ira aumentar a velocidade gradualmente, se tiver algum problema o senhor nos avisa ok?"
"Sim, teve um problema. Ninguém me disse que iam arrancar os meus pelos do peito." meu pensamento estava gritando"O que a minha mulher ia dizer quando me visse assim?"
"Pra que mesmo que eu vim aqui?"
A esteira começou, e ela disse, esta com a pressão alta. "É claro." eu pensei "Queria ver como seria se fosse eu cortando fora os teus peitos."
Foi ai que a caminhada começou a acelerar e eu esqueci da minha virilidade ofendida e comecei a tentar quebrar a barreira do som. Comecei caminhando, de repente eram umas passadas enormes, e quando vi tava correndo. Me senti o flash naquele desenho da Liga da Justiça em que ele corre da Terra até o Sol e dá umas voltas nele.
"Minhas pernas." rompi a barreira do som.
Com o aviso a esteira foi diminuindo a velocidade gradativamente. Eu estava ofegante, tinha corrido por intermináveis 7 minutos.
"A pressão alta não está afetando seu coração." "Precisa normaliza-la, descobrir do que é, mas o senhor pode ficar tranquilo, as batidas do seu coração estão perfeitas.Cada uma delas. Cada batida do seu coração."
"Que bom. Mas minhas pernas não." Conclui. Elas tremiam.
Mais tarde eu estava me despedindo, pegando o resultado dos exames e descendo até o meu carro. Entrei nele, e liguei, fazendo o carro responder aos meus comandos que queriam que ele me levasse de volta pra casa. Antes eu levantei a camisa e observei, a porra dos lugares raspados.
Pensei;
Que coisa horrivel...
...
...
Graças a Deus, não tem nada com meu coração.
Liguei o rádio e vim dirigindo ao som de The Police tocando "Every step you take".
Por alguma razão me lembrei da esteira.
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